Políticas e participação nas zonas costeiras face aos impactos das alterações climáticas.

Abstract

As políticas de adaptação às alterações climáticas começam a assumir carácter prioritário, tanto na Europa como em Portugal, apesar da actual recessão económica. Os motivos conhecem-se: cada vez se torna mais claro que os esforços de mitigação já não serão suficientes para evitar o aquecimento global. As consequências das alterações climáticas e, por conseguinte, a necessidade de adaptação das sociedades, são já inevitáveis. Foi nesta óptica que a União Europeia lançou recentemente a Estratégia Europeia de Adaptação às Alterações Climáticas, em que convida todos os países da UE a avançar com propostas concretas. Portugal aprovou a sua estratégia nacional em 2010 mas, tal como muitos outros Estados-membros, tarda em aplicar medidas. As previsões apontam para que a inacção venha a ter custos ainda mais avultados, em particular para as zonas e populações mais vulneráveis. É o caso das zonas costeiras, que já estavam em recuo devido aos efeitos da erosão costeira e enfrentam agora a ameaça da subida do nível médio do mar e do aumento dos eventos extremos. As políticas públicas de adaptação têm colocado ênfase na necessidade de envolver os stakeholders e as populações locais que irão ser directamente afectados por estes impactos. As dimensões sociais, económicas e culturais são fundamentais para a eficácia de quaisquer medidas de adaptação. Neste contexto, urge reforçar o contributo das ciências sociais. O projecto Change – Mudanças Climáticas, Costeiras e Sociais (PTDC/CSSOC/ 100376/2008), estudou, durante três anos, algumas das zonas costeiras em risco em Portugal, recolhendo informação sobre as percepções de risco e as visões futuras das comunidades locais. O projecto, coordenado pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICSUL), centrou-se em particular sobre as faixas costeiras da Vagueira, Quarteira e Costa da Caparica e envolveu uma equipa interdisciplinar, da qual fizeram parte investigadores da Faculdade de Ciências da UL. Complementando a abordagem das ciências sociais com a das ciências naturais, recorreu-se a um conjunto de metodologias quantitativas e qualitativas – entrevistas, inquéritos, focus groups, observação directa, workshops - e elaborou-se um conjunto de mapeamentos de susceptibilidade ao avanço do mar, tendo em conta os impactos previsíveis das alterações climáticas (horizontes temporais de 2025, 2050 e 2100). Os cenários criados para cada uma das zonas em estudo foram debatidos com os stakeholders locais, focando aspectos como as vulnerabilidades físicas, sociais e económicas destas zonas costeiras; os possíveis impactos das alterações climáticas no recuo da linha de costa e nos eventos extremos e as estratégias futuras de adaptação a estes desafios, incluindo o seu financiamento. Esta comunicação baseia-se nos resultados da análise sobre as políticas públicas do litoral, complementada pelos focus groups realizados nas zonas de estudo. Por um lado, identificam-se fragilidades no quadro politico-administrativo que têm levado a uma gestão fragmentada e burocratizada da orla costeira em Portugal. Pelo caminho, identificámos bloqueios de comunicação e conhecimento. E, por outro lado, analisam-se os entraves que se levantam à participação pública, aferindo a disponibilidade dos stakeholders para participar em futuros modelos de governança costeira e o potencial unificador da ameaça de desaparecimento de um território que, nas últimas décadas, tem vindo a concentrar a maior parte do capital social e económico do país.