Utilize este identificador para referenciar este registo: http://hdl.handle.net/10451/60075
Título: A decolonial turn in public memory? Hamburg and Lisbon compared
Autor: Prinzleve, Jonas
Orientador: Peralta, Elsa
Pinto, Marta Pacheco
Erll, Astrid
Data de Defesa: 8-Set-2023
Resumo: At least since the 2000s, postcolonial discourses have expanded across cultural, academic and activist forums in European metropolitan centres, even if at different speeds and intensities. This doctoral thesis explores how the cultural politics of remembrance in European cities with extensive colonial-imperial legacies adapt to the postcolonial age. It examines the changing landscapes of public memory in post-imperial Hamburg and Lisbon from a comparative, postcolonial perspective. It is argued that the two European port cities are experiencing a nascent decolonial cultural turn, albeit contingent on powerful post-imperial narratives and neoliberal urban dependencies. Written at the crossroad of memory studies, postcolonial studies and urban studies, the thesis explores Hamburg and Lisbon as nodal points of local, national and global discursive and cultural flows. It draws on a selected range of examples of contested post-imperial places, postcolonial civic initiatives, (counter-)monuments and museum exhibitions, highlighting the multiple affective encounters and performative responses that colonial heritage elicits. Organised into three parts, the thesis focuses on urban space, civil society and museums. The first part compares the cultural landscapes of the waterfront development projects Hamburg HafenCity and Parque das Nações to explore how colonial heritage is reinvented and sanitised. The second part examines two postcolonial memorial initiatives, the Initiative Decolonize Bismarck in Hamburg and Djass in Lisbon, to discuss the cultural politics of networks of affected communities who negotiate with municipalities to reshape public memory landscapes. The last part looks at the cities’ post-imperial museum landscapes. It explores how the MARKK in Hamburg, an ethnology museum, and the Museum of Aljube in Lisbon, a memorial museum of difficult heritage, face the ethical and curatorial challenges of (their own) colonial-imperial legacies. The case studies foreground the predicaments of self-proclaimed global cities in which diasporic communities mobilise long-silenced transcultural memories of the colonial past to assert their public presence.
Pelo menos desde a década de 2000, os discursos pós-coloniais têm vindo a expandir-se através de fóruns culturais, académicos e activistas nos centros metropolitanos europeus, ainda que a velocidades e intensidades diferentes. Nesta tese examinam-se as paisagens culturais, em mudança, da memória pública de duas cidades pós-imperiais europeias, Hamburgo e Lisboa, mostrando como as suas políticas comemorativas se adaptam à era pós-colonial. Situando-se no cruzamento entre os estudos de memória, os estudos pós-coloniais e os estudos urbanos, este trabalho destaca as dificuldades das cidades que que se autodenominam como globais por se verem pressionadas a descolonizar as suas representações coloniais-imperiais. Argumenta-se que as cidades europeias estão a atravessar um momento de viragem cultural descolonial, embora subordinada a poderosas narrativas pós-imperiais e condições urbanas neoliberais. Redes de comunidades afectadas e iniciativas pós-coloniais negoceiam com municípios e instituições culturais a remodelação de espaços públicos de herança colonial. Ao contrário dos paradigmas anteriores de inclusão e representação, as políticas culturais que orientam as práticas descoloniais do património são impulsionadas por um horizonte de profunda transformação epistemológica e político-institucional. Em 2020, o assassinato de George Floyd e o movimento globalizante Black Lives Matter desencadearam protestos contra o racismo e os regimes de memória colonial em cidades por toda a Europa. As reivindicações de “descolonização!” tiveram ampla cobertura mediática. A tese apresenta uma análise oportuna das formações sociais e culturais em mutação que subjazem a esses protestos espontâneos. Investiga-se o modo como os discursos pós-coloniais emergiram e se expandiram nas universidades, nos museus e nas redes da sociedade civil nas cidades europeias de Hamburgo e Lisboa ao longo das duas últimas décadas. Constituindo mais de dois terços da população das cidades, as comunidades (pós-)migratórias e diaspóricas reconstroem e mobilizam a memória transcultural do passado colonial, há muito silenciada, para afirmarem a sua presença em espaços urbanos centrais. Nesta nova constelação pós-colonial global, as instituições culturais – ainda marcadas por estruturas de branquitude – vêem-se cada vez mais forçadas a envolver-se na história colonial e nos seus legados. Organizada em três partes, a tese explora o espaço urbano, a sociedade civil e os museus tanto em Hamburgo como em Lisboa, recorrendo a um conjunto seleccionado de exemplos de lugares pós-imperiais contestados, iniciativas cívicas pós-coloniais, (contra-)monumentos e exposições museológicas. As cidades de Hamburgo e Lisboa são apresentadas como pontos nodais de diferentes discursos e fluxos culturais locais, nacionais e globais, nos quais a memória cultural colonial suscita múltiplas formas de encontro afectivo e respostas performativas. A primeira parte da tese ilustra como o império moldou profundamente o espaço urbano, a memória cultural e a imagem pública das cidades. As cidades portuárias de Hamburgo e Lisboa foram – durante diferentes períodos históricos – metrópoles influentes do imperialismo europeu e do comércio colonial, estando interligadas na longa e violenta génese do mundo moderno globalizado. No entanto, actualmente, as paisagens da memória oficial destes centros urbanos silenciam legados indissociáveis de expropriação colonial, comércio escravizador e genocídio, e as atracções turísticas, por sua vez, lançam um olhar nostálgico sobre o império. Com base em projectos recentes de desenvolvimento da orla marítima, construídos em antigas docas coloniais, tanto em Hamburgo como em Lisboa, esta parte explora a forma como os planeadores urbanistas e os agentes culturais reinventaram e higienizaram o património colonial para o integrar em esquemas de marketing urbano próprios de cidades cosmopolitas, marítimas e globais. O capítulo 2 é dedicado ao estudo de caso da HafenCity. Em construção desde o início da década de 2000 no local do antigo porto colonial da cidade, o bairro ribeirinho no centro urbano apresenta-se como “o maior projecto de desenvolvimento urbano no interior de uma cidade da Europa” e como “um modelo para a nova cidade europeia sobre água”. Este capítulo explora a toponímia da área e os seus museus e sítios patrimoniais como configurações relacionais e contestadas da memória e da cultura. Expõe a “colonialidade da memória cultural”, mostrando como a herança colonial da HafenCity serve de base ao programa simbólico contemporâneo da zona. O capítulo redesenha as geografias afectivas de (des)pertença da herança colonial e traça as propostas descoloniais dos actores da sociedade civil. O capítulo 3 analisa o Parque das Nações, emblemática zona ribeirinha de Lisboa, que foi construído para a Exposição Mundial de 1998. A Expo’ 98 marcou o culminar de uma narrativa nacional pós-colonial reinventada, na qual a dita “Era dos Descobrimentos Portugueses” foi transformada numa figura comemorativa lúdica de encontro cultural, de mitologia e de curiosidade científica. Este capítulo traça esta nova narrativa através da arquitectura, da toponímia e das instituições culturais que animam a zona. Ao mesmo tempo, analisa as relações laborais racializadas e a segregação social que estiveram na origem da construção do bairro. A segunda parte da tese explora a memória pública, a sociedade civil e a política cultural descolonial em Hamburgo e Lisboa. Nas heterogéneas sociedades metropolitanas, as iniciativas pós-coloniais e os migrantes diaspóricos fazem campanha pela descolonização da memória pública colonial que está inscrita em toponímias urbanas, monumentos comemorativos e colecções de museus. examina-se surgimento desigual dos debates pós-coloniais às esferas académica, cultural e política, um fenómeno que ganhou visibilidade crescente desde o final da década de 1990 e o início dos anos 2000. Como é que esta chegada se traduziu em iniciativas de descolonização do património cultural urbano? O foco é direccionado para dois monumentos urbanos (contra-)proeminentes que exemplificam as estratégias políticas e estéticas das intervenções da sociedade civil. O capítulo 5 incide sobre o Monumento a Bismarck em Hamburgo. Erigido em 1906 pelas elites políticas e comerciais coloniais de Hamburgo, o maior monumento da cidade, uma estátua gigantesca do antigo chanceler alemão Otto von Bismarck (1815-1898), contempla o porto em direcção ao oceano como um feroz protector do comércio marítimo imperial. Recordado em todo o mundo como o organizador da Conferência Africana de Berlim de 1884/85, na Alemanha o legado colonial de Bismarck foi largamente negligenciado até há pouco tempo. No início de 2020, a iniciativa “Decolonize Bismarck” e o Conselho Consultivo para a Descolonização de Hamburgo revelaram como os financiadores locais do monumento foram cúmplices na aquisição de terras coloniais, na exploração colonial e em guerras de extermínio. Sob pressão pública e no meio dos protestos globais da Black Lives Matter, em Novembro de 2020, a cidade de Hamburgo admitiu publicamente patrocinar um redesenho pós-colonial participativo do Monumento a Bismarck, tornando-o um dos projectos mais significativos de memória pública pós-colonial na Alemanha. O capítulo 6 aborda o Memorial de Homenagem às Pessoas Escravizadas em Lisboa. Em 2017, o o grupo lisboeta sem fins lucrativos Djass Associação de Afrodescendentes ganhou um concurso de votação pública da Câmara Municipal de Lisboa para a construção de um Memorial de Homenagem às Pessoas Escravizadas de grande escala, incluindo um Centro Interpretativo no coração de Lisboa. Numa cidade dominada pela homenagem aos traficantes de escravos e pelas narrativas de um Portugal como colonizador amigável, a iniciativa visa reconhecer e “prestar homenagem aos milhões de pessoas escravizadas pelo império português”, bem como educar a respeito da presença histórica africana e negra em Lisboa. Este capítulo discute as dimensões estéticas e políticas das três propostas conceptuais e contemporâneas apresentadas ao concurso municipal e o processo de votação que favoreceu o projecto do artista Angolano Kiluanji Kia Henda. A última parte da tese investiga as paisagens dos museus da cidade, que desempenham um papel fundamental na negociação de significados sociais, valores e memória cultural colectiva. Os museus são sítios patrimoniais dinâmicos e heterogéneos onde se pode observar e estudar a relação em constante mudança de uma sociedade com o seu passado. Enquanto Hamburgo adere à imagem da cidade portuária hanseática orgulhosamente independente na qualidade de “Porta do Mundo”, Lisboa louva a expansão marítima como o seu património cultural global. Não obstante a memória pública triunfalista e monumental, nas últimas décadas, o “património difícil”, ou seja, acontecimentos e períodos negativos que incluem atrocidades em massa ou genocídio, começou a penetrar as galerias e os espaços de exposição urbanos. Como casos de estudo desta parte, foram escolhidos dois museus que se destacam das paisagens museológicas pós-imperiais dominantes nas cidades. O MARKK, em Hamburgo (capítulo 8), e o Museu do Aljube, em Lisboa (capítulo 9), estão ambos implicados no passado colonial-imperial local através da história das suas instituições e dos espaços em que se situam. A vontade dos museus de se envolverem com os seus difíceis legados tornou-os zonas de contacto para a sociedade civil pós-colonial e descolonial e em laboratórios para repensar as práticas descoloniais do património. O capítulo 8 explora as ambiguidades da política cultural descolonial do museu etnológico MARKK, que promoveu a investigação científica em “estudos raciais” durante o início do século XX e cujos benfeitores coloniais continuam a ser homenageados com nomes gravados nas paredes do edifício monumental. O capítulo 9 analisa o Museu do Aljube Resistência e Liberdade, em Lisboa, uma antiga prisão política do regime do Estado Novo português. Foi transformado num museu de história para rememorar os crimes da ditadura fascista-imperial. O capítulo apresenta uma crítica pós-colonial à exposição de longa duração do Museu do Aljube e traça o seu potencial de memória multidireccional.
URI: http://hdl.handle.net/10451/60075
Designação: Doutoramento no ramo de Estudos de Literatura e de Cultura, especialidade de Estudos Comparatistas
Aparece nas colecções:FL - Teses de Doutoramento

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